R. BADINTER (1928-2024)

©Richard Dumas /VU

FERNANDO EICHENBERG / PARIS

Tive o privilégio de encontrar Robert Badinter, o homem que aboliu a pena de morte e a guilhotina na França, em três ocasiões, todas elas em seu apartamento face ao belo Jardim de Luxemburgo, em Paris. Dois desses encontros foram entrevistas. O terceiro, no entanto, ocorrido em 2019, foi bastante singular. Havia solicitado mais uma entrevista, centrada em questões de justiça internacional. Ele recusou, argumentando que não tinha nada de novo a falar, e que não queria discorrer sobre temas que pudessem provocar polêmica na França, mesmo que suas palavras fossem publicadas em um jornal brasileiro . Mas me convidou mais uma vez para vir a seu apartamento para simplesmente conversar. Às 9h de uma manhã de verão ensolarada, lá estava eu a soar sua porta. Ele me recebeu em seu gabinete, vestindo terno e gravata. Então com 91 anos, seu corpo aparentava frágil e sua voz enfraquecida, mas conversamos alegremente por mais de uma hora. Em boa parte do tempo, foi ele quem me entrevistou, indagando, estupefato, sobre a eleição de Jair Bolsonaro à presidência do Brasil. Mas não deixei de fazer as perguntas que me interessavam. E também falamos de amenidades. Ao final, insisti que ele permistisse que usasse suas palavras em um texto para o jornal, mas se manteve  irredutível na recusa. Foi a última vez que o vi. Nesta sexta-feira, 9 de fevereiro, soube com tristeza de sua morte, aos 95 anos.

Aqui abaixo o texto que escrevi no meu livro de entrevistas “Entre Aspas vol. 2” (L&PM), de nosso primeiro encontro.

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ENTREVISTA COM O ESCRITOR MOHAMED MBOUGAR SARR

FERNANDO EICHENBERG/ QUATRO CINCO UM

PARIS – Ao encerrar em Lisboa, em junho, sua longa turnê de 65 shows em nove meses, Chico Buarque voou rumo a Paris para merecidos dias de descanso antes de retornar ao Brasil. Da estante de sua morada na capital francesa, retirou um livro adormecido, que havia ganhado de presente de aniversário no ano passado: La plus secrète mémoire des hommes, do escritor senegalês Mohamed Mbougar Sarr. Aberta a primeira página, não conseguiu mais parar a leitura. “É simplesmente maravilhoso! Ele escreve maravilhosamente bem, e além do mais é engraçado, tem humor. Após ler esse livro, não sei como poderei voltar a escrever novamente”, exagerou o escritor laureado com o prestigioso prêmio literário Camões, sem esconder seu vivo entusiasmo.

Sarr não seduziu com sua escrita apenas o escritor brasileiro, mas também o exigente júri do Goncourt, o mais importante prêmio literário francês. A mais recôndita memória dos homens, assim traduzido e recém-lançado no Brasil pela editora Fósforo, foi apontado vencedor do Goncourt em 2021, por unanimidade, e desde então tem acumulado elogios da crítica e conquistado leitores pelo mundo.

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Entrevista: Ben Harper

Fotos: © Fe Pinheiro / Styling: Sonia Bedere

FERNANDO EICHENBERG – O GLOBO

PARIS – Ben Harper chegou para a entrevista, agendada no bar do hotel parisiense Maison Souquet, com seu tradicional gorro cobrindo a cabeça, exibindo suas tatuagens maori nos braços, e suado, segurando uma longa prancha de skate. A garçonete se ofereceu para guardar o volumoso objeto, mas ele mesmo o ajeitou encostado à parede. “Ando de skate por três ou quatro horas, quatro vezes por semana”, contou, ao acomodar a corpulência de seus quase 1,90 metros de altura na estreita poltrona de veludo vermelho. “Não sou um pai acabado. I’m rockin’ and rollin. O ritmo de meu coração é de 39 batidas por minuto à noite. Com o skate e meu coração, let’s go”. De pronto, mostrou um aplicativo em seu celular que mensura a cadência cardíaca e a perda de calorias. “Para ficar no meu peso, preciso queimar diariamente 450 calorias. No final do dia, chego até 375 calorias apenas caminhando, então, antes de ir para a cama, corro um pouco e está feito. Veja, agora mesmo meu coração está em 70 batidas por minuto, o que é baixo para essa hora do dia. Ao despertar, o aplicativo dá uma nota para o seu dia anterior e o seu sono, se você teve uma boa performance, ganha uma coroa, e aí estou pronto para encarar a nova jornada. É louco!”, diz, rindo.

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van gogh: 74 quadros em 70 dias antes de morrer

Raízes de árvores, úiltimo quadro pintado por Van Gogh, no dia de sua tentativa de suícidio.

Em 20 de maio de 1890, Vincent Van Gogh, aos 37 anos, se mudou para Auvers-sur-Oise, vilarejo ao norte de Paris. O artista queria ficar próximo de seu irmão Theo, que morava na capital francesa, e esperava melhorar de suas crises psicológicas junto ao Dr. Gachet, especialista no tratamento da “melancolia” e também um colecionador de arte, pintor amador e amigo dos impressionistas. Em 29 de julho, Van Gogh morreu em consequência de uma tentativa de suicídio cometida dois dias antes, ao atirar contra o próprio peito com um revolver calibre 7mm. Nestes poucos mais de dois meses em Auvers-sur-Oise, produziu 74 quadros e 33 desenhos, incluindo algumas de suas obras mais emblemáticas, como A igreja de Auvers, O doutor Gachet, Autorretrato e Campo de trigo com corvos.

Em uma das mais aguardadas exposições do outono parisiense, o Museu d’Orsay apresenta “Van Gogh em Auvers-sur-Oise, os últimos meses”, na qual apresenta uma importante parte dessa profícua produção dos derradeiros momentos de vida do artista, que em um frenesi criativo pintava de uma a duas telas por dia. Trata-se de uma rara reunião de obras, de cerca de 50 telas e duas dezenas de desenhos, incluindo, pela primeira vez juntas, 11 das 13 criações da série panorâmica, composta de telas de 50 centímetros de altura por um metro de largura. A exposição, que ficará aberta até o dia 4 de fevereiro, inclui ainda cartas, objetos pessoais e também um espaço de realidade virtual.

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RIP: JANE BIRKIN (1946-2023)

©Nico Bustos

FERNANDO EICHENBERG / PARIS

Ao longo de minha carreira jornalística em Paris, entrevistei Jane Birkin três vezes, a primeira em 2009, e a última há pouco menos de quatro anos, em 2019. Neste derradeiro encontro em um uma bela e fria manhã de novembro, ela me recebeu em sua casa, nas proximidades da praça Saint-Sulplice. Na sala de seu aconchegante apartamento, me ofereceu uma taça de chá, que ela mesmo fez, e conversamos pausadamente, enquanto seu inseparável buldogue Dolly dormia, roncando estirado no tapete. O resultado de nosso primeiro encontro, que reproduzo aqui, está publicado no segundo volume de meu livro de entrevistas, “Entre Aspas vol. 2” (ed. L&PM). No final, os links para as duas outras entrevistas — uma em que fala da trágica morte de sua filha, Kate Barry, e outra da publicação de seu diário íntimo — para quem quiser saber sobre essa luminosa, humana e singular artista, que já deixa saudades.

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Ucrânia, Mercosul e nova ordem financeira na agenda de emmanuel Macron com Lula em paris

Lula e Macron no Palácio do Eliseu, em Paris. ©Fernando Eichenberg

FERNANDO EICHENBERG / O GLOBO

PARIS – Garantir a presença do presidente Lula em Paris para participar da Cúpula para um Novo Pacto Financeiro Global foi tratado pelo anfitrião do evento, o líder francês Emmanuel Macron, como uma missão prioritária. Depois de quatro anos de governo Bolsonaro, nos quais os contatos políticos de alto nível com a França foram suspensos, Macron festejou a volta ao poder de seu “velho conhecido” Lula, com quem reivindica uma relação de amizade, para relançar a parceria entre os dois países. Nesta nova lua de mel, no entanto, também há lugar para discordâncias. Hoje, Brasília e Paris divergem, principalmente, nas questões do conflito na Ucrânia e do acordo de livre comércio União Europeia-Mercosul.

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ROLAND CASTRO (1940-2023)

© Castro Denissof Associés

FERNANDO EICHENBERG / PARIS

Arquiteto visionário, que ganhou notoriedade ao associar sua concepção de habitação e urbanismo a um combate político, e infatigável militante – foi um dos expoentes do movimento de Maio de 68 (experiência da qual levou sete anos em análise com o psicanalista Jacques Lacan para se recuperar) –, o  francês Roland Castro morreu no dia 9 de março, aos 82 anos, em um hospital parisiense. Em 2007, nos encontramos para uma entrevista em seu escritório na capital francesa. Leia aqui o resultado de nossa conversa, também publicada no meu segundo livro de entrevistas, “Entre Aspas vol.2” (ed. L&PM).

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just fontaine (1933-2023)

Just Fontaine: medo de Rolando porque o craque brasileiro nasceu no mesmo dia de sua mulher, Arlette. © AFP

FERNANDO EICHENBERG

A lenda do futebol francês Just Fontaine, até hoje detentor do recorde de gols marcados em uma Copa do Mundo, faleceu neste 1° de março, aos 89 anos, na cidade de Toulouse. Tive a chance de entrevistá-lo uma vez, às vésperas do Mundial da Alemanha, em 2006. Aqui, o resultado de nosso encontro.

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População de sem-teto sobe 150% em uma década na França, segundo a fundação Abbé pierre

Grupo de imigrantes dorme na rua cerca da estação de metrô de La Chapelle, em Paris.
© Anne Margueritat/AFP

FERNANDO EICHENBERG / O GLOBO

PARIS – O número de pessoas sem domicílio na França mais que dobrou na última década, passando de 133 mil para 330 mil, segundo a Fundação Abbé Pierre. A contagem sobe para os indivíduos sem moradia pessoal, hospedados por terceiros ou em um alojamento provisório: 1.098 milhão. Quando se acrescentam os franceses morando em “condições muito difíceis”, chega-se a 4,148 milhões. O diagnóstico da entidade — fundada em 1992 pela luta do direito à habitação — alertou para o agravamento das dificuldades na busca por um teto no país, tanto para a população de baixa renda ou em situação precária, incluídos desempregados e imigrantes, como para uma classe média com perda de poder aquisitivo face ao crescente valor dos aluguéis.

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Guerra prolongada na Ucrânia põe Europa diante de incertezas

Moradores passam por um mural em Kiev mostrando um grafite do Kremlin em chamas: guerra expôs interesses divergentes do eixo franco-alemão e dos países do Leste Europeu. Foto: Genya Savilov/AFP

FERNANDO EICHENBERG / O GLOBO

PARIS – A eclosão da guerra na Ucrânia em 24 de fevereiro passado e seu prolongamento até hoje abalaram a agenda de uma Europa em busca de união política, crescimento econômico e maior independência em questões de segurança e defesa. A invasão das forças russas de Vladimir Putin em território ucraniano obrigou a União Europeia e seus países membros a reverem estratégias de curto a longo prazo, provocou a redistribuição de cartas no tabuleiro geopolítico, reavaliou alianças e alterou planos militares e energéticos.­

A guerra revirou completamente o espaço europeu – resume Tara Varma, analista do European Council on Foreign Relations (ECFR). – Infelizmente, este conflito não terminará logo, e há uma verdadeira questão sobre o que a UE fará no dia de amanhã.

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Após quatro anos difíceis sob governo bolsonaro, relação frança-brasil é retomada em novas bases

Lula foi recebido pelo presidente Emmanuel Macron para um almoço no Palácio do Eliseu em 17 de novembro de 2021. © Ricardo Stuckert

FERNANDO EICHENBERG / O GLOBO

PARIS – Os quatro anos do governo Bolsonaro se destacaram por uma explícita animosidade política e diplomática com a França, histórico parceiro do Brasil. A cartilha isolacionista e antiambientalista do período bolsonarista, acrescida de agressões verbais do presidente brasileiro e de ministros de seu governo, levaram ao estremecimento e a um retrocesso nas relações entre Brasília e Paris. Com o retorno de Lula ao Palácio do Planalto, os dois países começaram a articular, mesmo antes da posse, uma reaproximação e o restabelecimento da relação bilateral em novas bases.

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GOLSHIFTEH FARAHANI: ‘Se vencermos no Irã, a mulher ganhará e o mundo também’

Atriz iraniana Golshfiteh Farahani, exilada em Paris desde 2008, se tornou uma porta voz do movimento contra a ditadura do regime islmâmico de Teerã. ©Philippe Gay

FERNANDO EICHENBERG / O GLOBO

PARIS – A atriz iraniana Golshifteh Farahani se converteu em uma infatigável ativista em apoio à revolta deflagrada em seu país em setembro, no rastro da morte da jovem Masha Amini, de 22 anos, sob custódia da polícia da moralidade por suposto uso inadequado do véu islâmico. Exilada em Paris desde 2008, a atriz não passa um dia sem postar aos seus mais de 15 milhões de seguidores no Instagram denúncias contra a violência e os desmandos praticados pela ditadura islâmica comandada com mão de ferro pelo líder supremo do país, o aiatolá Ali Khamenei. Como uma porta-voz no exterior do movimento, tem se manifestado como pode, seja nas redes sociais ou escrevendo uma tribuna para o jornal New York Times. 

– Por vezes, me sinto realmente desesperada. Outras vezes, repleta de esperança. Algumas vezes em lágrimas ou com raiva. Cada dia é uma emoção diferente. A única coisa que sei é que não posso abandonar ­­­­­– desabafa ao Globo, ao final de mais um dia de filmagens para um novo longa-metragem na França.

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TEATRO: Christiane Jatahy EM alta voltagem

Foto: © Leo Aversa

FERNANDO EICHENBERG/ REVISTA PIAUÍ

PARIS – Em 2007, a diretora de teatro Christiane Jatahy foi uma das convidadas do Festival de Viena, um prestigiado evento de artes que acontece todo ano na capital austríaca. A encenadora carioca e sua trupe apresentaram a peça A Falta que Nos Move, que tinha por tema as complicadas relações familiares. O espetáculo começava de maneira inusitada: com a informação de que um dos atores não tinha chegado para a apresentação. A ideia era que a notícia fosse dada ao público do modo o mais realista possível, levando a crer que o elenco estava realmente desfalcado.

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RIP: BRUNO LATOUR (1947-2022)

Foto: ©Fernando Eichenberg/2013

FERNANDO EICHENBERG

Tive a chance de conversar com o pensador francês Bruno Latour uma vez em Paris, para uma entrevista para o jornal O Globo. Além de suas bem-vindas reflexões sobre o mundo moderno, tenho a vívida lembrança de de sua extrema generosidade e bom humor em nosso encontro, em sua sala no Instituto de Estudos Políticos de Paris (Sciences-po). O incansável intelectual nos deixou neste 9 de outubro de 2022, aos 75 anos, vitimado pelo câncer. A seguir a entrevista publicada no jornal e também no segundo volume de meu livro de entrevistas “Entre Aspas – vol 2” (ed. L&PM).

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RIP: J.-L. GODARD (1930-2022)

Jean-Luc Godard em 1998. ©Richard Dumas/Agence VU

FERNANDO EICHENBERG/HEADLINE

PARIS – Na última vez em que vi Jean-Luc Godard pessoalmente, ele estava sentado em uma mesa do café parisiense Le Select. O local não poderia ser mais emblemático. Reduto de artistas e intelectuais no século passado, o célebre estabelecimento do número 99 no boulevard Montparnasse acolheu em suas mesas nomes como os de Luis Buñuel, Sergei Eisenstein, Vladimir Nabokov, Ernesty Hemingway, Samuel Beckett, Henry Miller, Anaïs Nin, Isadora Duncan, Allen Ginsberg, Jack Kerouac, William Burroughs, Salvador Dalí, Joan Miró, Erik Satie, Jean Cocteau, entre tantos outros. Godard era um dos habitués do café. Mais do que isso, filmou ali uma das cenas do cult Acossado. Naquela tarde, ele estava solitário, um jornal fechado sobre a mesa, um fumegante charuto à boca, o olhar vago mirando o movimento da rua. Depois que paguei a minha conta, no caminho de saída parei diante de sua mesa, ele levantou a cabeça e me encarou com seus óculos de espessas lentes. Eu disse que ele certamente não lembraria de mim, e me apresentei como um jornalista brasileiro que um dia o havia entrevistado, e que guardava uma bela lembrança de nosso encontro. Ele disse uma ou duas palavras simpáticas, mas deixando claro que não desejava ser incomodado, e me despedi.

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RIP: Sempé (1932-2022)

Sempé em sua casa, em Paris. FOTOS: © Fernando Eichenberg

FERNANDO EICHENBERG

Certa vez, em um domingo flanava pelo bulevar Montparnasse, em Paris, na companhia dos queridos amigos Luis Fernando Verissimo e Lúcia, e comentei que há pouco tempo havia entrevistado o grande Sempé em sua casa, no último andar de um prédio ali perto de onde estávamos. Verissimo, fã do desenhista francês, de pronto respondeu positivamente à minha pergunta se gostariam de conhecer o endereço. Caminhamos alguns minutos e logo estávamos em frente ao prédio. Mostrei o interfone, e recordo de Verissimo olhando para o alto, tentando imaginar, talvez, naquele momento o incansável Sempé debruçado em sua mesa, lápis à mão, criando mais uma de suas obras-primas. Havia entrevistado Sempé para o hoje extinto caderno Prosa & Verso, de O Globo. Recebido generosamente pelo anfitrião, além da ótima conversa, aproveitei para, com o seu consentimento, metralhar com minha câmera o personagem e o entorno. Jeans-Jacques Sempé nos deixou nesta quinta-feira, 11 de agosto. Aqui o resultado de nosso encontro, também publicado no segundo volume de meu livro de entrevistas, “Entre Aspas 2” (L&PM).

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RIP: PETER BROOK (1925-2022)

FERNANDO EICHENBERG

Tive a chance de entrevistar o grande diretor de teatro Peter Brook, que nos deixou no sábado 2 de julho de 2022, aos 97 anos bem vividos, em três oportunidades: duas delas para a revista Bravo! e outra para o Teatro Sesc. Aqui o resultado de nossos encontros, publicado no primeiro volume de meu livro de entrevistas ‘Entre Aspas vol.1″ (LP&M).

***

Em outubro de 1990, o diretor de teatro Peter Brook foi entrevistado no programa Le Bon Plaisir, da rádio francesa France-Culture. “O senhor aceitou essa entrevista mesmo tendo declarado um dia que jamais responderia as perguntas dos outros, só daria respostas as suas próprias interrogações. E então?”, questionou a jornalista Béatrice Clérc. O sábio Brook, já apelidado de Buda por seus atores, tratou de se explicar: “Tenho um primeiro princípio fundamental: nunca se apegar ao que dissemos no passado. Quando dizemos algo, é num dado momento, e no dia seguinte poderá ser exatamente o contrário. As contradições existem, mas se na vida adicionarmos todas elas, chegaremos a uma certa verdade”. Brook – na época, pelo menos – seguia ainda uma segunda conduta, também revelada a sua entrevistadora: “Meu outro princípio é o de nunca sentir que é preciso dizer a verdade aos jornalistas. Eles têm uma profissão que é a de fazer perguntas. Se as respondemos é em função das circunstâncias. Assim, por exemplo, diante de você, tratarei de ser relativamente honesto, não mais do que isso”.

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Eleição LEGISLATIVA joga Macron nos braços de conservadores e testa programa da extrema direita DE MARINE LE PEN

Macron chega para votar no domingo: apesar dos alertas dele de que uma derrota de sua coalizão seria o caos, analistas afirmam que perda da maioria no Parlamento não o impedirá de governar.
©Ludovic Marin/AFP

FERNANDO EICHENBERG / O GLOBO

PARIS — As eleições legislativas francesas abalaram o cenário político do país. O resultado das urnas compromete a governabilidade do segundo mandato do presidente Emmanuel Macron, agora sem maioria parlamentar absoluta e obrigado a costurar uma nova estratégia de alianças políticas. A Reunião Nacional (RN), da líder de extrema direita Marine Le Pen, terá de provar na prática seu novo e surpreendente status, ao passar de apenas oito para 89 deputados na Assembleia Nacional. É O Mesmo desafio para o renascimento da esquerda como principal força de oposição, por meio da coligação Nova União Popular Ecológica e Social (Nupes). Sem esquecer o elevado índice de abstenção, persistente reflexo da desconfiança do eleitorado e de uma fraturada realidade política e social.

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“Terceiro turno” na França testa nova frente de esquerda e ameaça a maioria parlamentar de emmanuel Macron

Depois de liderar a união das esquerdas, Jean-Luc Mélenchon (ao centro) almeja maioria que obrigue Macron a nomeá-lo prileiro-ministro. © Yohan Bonnet/AFP

FERNANDO EICHENBERG/ O GLOBO

PARIS – Após sua reeleição à presidência da França, em abril, Emmanuel Macron não revelava maiores preocupações com a renovação de sua maioria parlamentar de governo no pleito legislativo, cujo primeiro turno ocorre neste domingo. Em meio às celebrações da vitória pelo segundo mandato, o presidente não contava com o surgimento da Nupes, sigla para Nova União Popular Ecológica e Social, agrupamento das principais forças de esquerda do país. O novo cenário eleitoral ameaça suas pretensões de governar sem a necessidade de costurar alianças políticas, e apresenta o risco, embora considerado pouco provável, de que se veja obrigado a nomear um primeiro-ministro do campo da oposição, em um sistema de coabitação.

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Franceses votam hoje nas urnas para eleger presidente “por exclusão”

Macron e Le Pen durante debate na TV, antes do segundo turno da eleição à Presidência, neste domingo.

FERNANDO EICHENBERG/ O GLOBO

PARIS – As urnas decidem neste domingo quem será o próximo presidente da França: o candidato de centro-direita Emmanuel Macron, em busca da reeleição, ou a representante da extrema direita, Marine Le Pen. A disputa repete o cenário da precedente eleição presidencial francesa, em 2017, vencida por Macron por 66,1% a 33,9%. Os cinco anos desde então, no entanto, alteraram o contexto político e a imagem dos dois candidatos. As pesquisas apontam neste duelo final uma vantagem para Macron, mas inferior aos índices do pleito anterior, e a ameaça de uma vitória da ultradireita paira novamente sobre o país.

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Extrema direita de Marine le pen ameaça favoritismo de Macron na eleição dste domingo na frança

Comício tardio: diante de cartazes dos candidatos, eleitores esperam chegada de Macron a comício em Spezet; ocupado com guerra, ele atrasou campanha em votação na qual poder aquisitivo é a maior preocupação. © Stephane Mae/Reuters

FERNANDO EICHENBERG/ O GLOBO

PARIS – A França começa a eleger a partir deste domingo o ocupante do Palácio do Eliseu pelos próximos cinco anos. O favoritismo inicial do presidente Emmanuel Macron à reeleição derreteu nos últimos dias, segundo as pesquisas, ameaçado pela ascensão da candidata de extrema direita Marine Le Pen. Em uma campanha morna, abafada pela pandemia da Covid-19 e a guerra da Ucrânia, boa parte dos 48,7 milhões de inscritos nas listas eleitorais poderão abdicar do voto, na previsão de um forte índice de abstenção. A nova dinâmica surgida na reta final para o pleito, no entanto, alimenta incertezas em relação aos resultados e também à mobilização do eleitorado.

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Efeitos da guerra da Ucrânia pairam sobre os franceses no pós-EleiçÃO

FERNANDO EICHENBERG/ O GLOBO

PARIS – Candidato à reeleição na França, o presidente Emmanuel Macron coloca à prova nas urnas seu mandato, marcado por críticas à verticalidade do poder, pelo movimento protestatório dos coletes amarelos, a crise sanitária da Covid-19 e, no final de governo, a guerra da Ucrânia. O vencedor do segundo turno, no dia 24, presidirá um país ameaçado pelas consequências econômicas do conflito europeu, o retorno da inflação, os desafios da transição energética e uma crescente insatisfação e fratura sociais.

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LOUIS POUZIN, gurU do datagrama: “o HOMEM QUE NÃO INVENTOU A INTERNET”

Louis Pouzin, hoje aos 90 anos. Na edição de março da revista Piauí conto como a França jogou no lixo a chance de inventar a internet. ©Fernando Eichenberg

FERNANDO EICHENBERG/ REVISTA PIAUÍ

PARIS/PLOURHAN – Na tarde de 17 de dezembro de 1996, a Biblioteca Nacional da França (BnF) havia preparado com zelo a cerimônia de abertura ao público de seu novo espaço de 7,5 hectares no bairro Tolbiac, em Paris. O ambicioso projeto fora anunciado em 1988 pelo presidente socialista François Mitterrand, exaltado como a “maior e mais moderna biblioteca do mundo”, recorrendo às “tecnologias mais avançadas de transmissão de dados”. Mitterrand conseguiu inaugurar oficialmente o local, sem os livros e documentos, em março de 1995, no apagar das luzes de seu segundo mandato. Coube a seu sucessor e rival, o conservador recém-eleito Jacques Chirac, abrir com pompa presidencial as portas da edificação de linhas puristas, de quatro torres de vidro, projetada à beira do rio Sena pelo arquiteto francês Dominique Perrault.

Na visita de praxe acompanhada pela imprensa, Chirac, em pé diante de um computador, acompanhava atentamente uma demonstração sobre as funcionalidades da internet na biblioteca quando interrompeu seu interlocutor: “Mouse? O que é mouse?”. A sequência, exibida no telejornal das 20h do canal France 2, viralizou segundo os meios da época e inspirou um sketch do então célebre programa humorístico de marionetes “Les Guignols de l’Info”, do Canal Plus. A gafe perdurou por anos com diferentes enredos, e a pecha de ignorante do mundo da informática perseguiu Chirac até o final de sua vida. Sua ex-conselheira para o fomento da internet confessou certa vez: “Ele ficou completamente traumatizado pelo affaire do mouse”. 

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ELEIÇÃO NA FRANÇA: Com esquerda esvaziada, três candidatos da direita lutam para ir ao segundo turno contra Macron

Valérie Pécresse (centro) com dirigentes dos Republicanos. Na campanha, ela trocou a célebre divisa “liberdade, igualdade, fraternidade” pelo tríptico “liberdade, autoridade, dignidade” .
©Christophe Archambault /AFP

FERNANDO EICHENBERG / O GLOBO

PARIS — A campanha para as eleições presidenciais francesas de abril deste ano, oficialmente lançada neste mês, tem sido marcada por uma radicalização à direita dos debates. De acordo com as pesquisas, três candidatos aparecem com chances de passar a um eventual segundo turno para enfrentar o presidente Emmanuel Macron, por enquanto à frente nas intenções de voto e tido como assegurado no duelo final. Valérie Pécresse, da direita tradicional, disputa com dois nomes da ultradireita, Marine Le Pen e Éric Zemmour, o direito de sonhar com o Palácio do Eliseu. Já o campo da esquerda amarga as últimas posições, incapaz de pesar no debate das urnas.

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Mariame Tighanimime conta como levou APENAS CINCO minutos para colocar o véu islâmico e CINCO anos para retirÁ-LO

Mariame Tighanimine é doutoranda em sociologia no Instituto de Estudos Políticos de Paris (Sciences-Po). ©Patrice Normand

FERNANDO EICHENBERG / O GLOBO

PARIS – Aos 10 anos de idade, Mariame Thiganimine, francesa de família muçulmana originária do Marrocos, passou a portar diariamente o véu islâmico, o hijab. Dezoito anos depois, aos 28, retirou-o definitivamente. Hoje, aos 33, lançou um livro-testemunho no qual conta como levou “cinco minutos” para colocar o véu e “cinco anos” para se desfazer da peça de tecido que se tornou motivo de inúmeras polêmicas nas sociedades modernas. Em “Dévoilons-nous” (Desvelemo-nos, ed. l’Olivier), Mariame narra sua experiência íntima, dirigindo-se tanto a defensores como a críticos do véu, condenando a forma como a questão é tratada pelos poderes públicos, políticos e parte da sociedade. Liberta do hijab, não se livrou de toda forma opressão: se diz hoje vítima de racismo e sexismo. 

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Bolloré: o “murdoch francês” por trÁs do candidato de extrema direita éric zeMmour

Vincent Bolloré: canal CNews deu visibilidade ao candidato da direita radical Éric Zemmour. ©Marlene Awaad/Bloomberg

FERNANDO EICHENBERG / O GLOBO

PARIS –  A candidatura do ultradireitista Éric Zemmour às eleições presidenciais francesas de 2022 não é fruto do acaso. Por trás de sua ascensão no cenário político nacional está o megaempresário francês Vincent Bolloré, que nos últimos seis anos constituiu um império de mídia focado em temas caros à extrema direita, como a imigração e o Islã. A ofensiva conservadora do industrial bilionário nos debates do país tem sido comparada à influência na política americana do magnata da mídia Rupert Murdoch e seu canal Fox News.

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eleiçÃO presidenciaL 2022: Éric Zemmour, polemista da ultradireita, embola a campanha na França

Éric Zemmour, surpresa nas pesquisas para o pleito presidencial francesa de 2022. ©Ludovic Marin/AFP

FERNANDO EICHENBERG/ O GLOBO

PARIS – A seis meses do pleito presidencial francês, em abril de 2022, surpresas aumentam as incertezas no cenário eleitoral. As pesquisas indicavam até o momento uma nova disputa de segundo turno entre o presidente Emmanuel Macron e a candidata de extrema direita Marine Le Pen, como em 2017, com vantagem para a reeleição do primeiro. Mas a potencial candidatura do polemista de ultradireita Éric Zemmour alterou o tabuleiro político e abriu novas possibilidades para o resultado das urnas, em uma pré-campanha marcada até agora por temas caros ao campo conservador, como imigração, segurança e questões identitárias.

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em paris, CRISTIANA REALI LEVA os combates de SIMONE VEIL PARA O PALCO

©Pascalito

FERNANDO EICHENBERG / O GLOBO

PARIS – A atriz brasileira Cristiana Reali está de volta aos palcos franceses após uma longa pausa forçada pela pandemia da Covid-19. E retornou encarnando uma das personagens mais emblemáticas, populares e admiradas na França : Simone Veil (1927-2017), sobrevivente de Auschwitz, defensora dos direitos das mulheres, autora da lei que legalizou o aborto no país, primeira presidente eleita do Parlamento Europeu e arauto da reconciliação e construção europeia no pós-Segunda Guerra. Um ano após a sua morte, aos 89 anos, foi entronizada no Panteão, célebre monumento onde repousam as grandes personalidades nacionais.

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Autoritarismo está por trás de discurso de ameaça de guerra civil na França, diz sociólogo

Ato do movimento dos coletes amarelos em Paris com a inscrição ‘traidores da nação’ no chão; arsenal repressivo aumentou com luta antiterrorista. ©Benoit Tessier / Reuters

FERNANDO EICHENBERG / O GLOBO

PARIS – O discurso de ameaça de uma guerra civil tem sido presente na França, adotado seja por militares, políticos da extrema direita e da direita e mesmo membros do governo. Generais da reserva e militares da ativa lançaram dois manifestos alertando para o quadro de insegurança e de prenúncio de guerra civil no país, e ameaçando com uma possível intervenção do Exército. O tema é recorrente nas manifestações da Reunião Nacional (RN), partido de extrema direita liderado por Marine Le Pen. Considerado um nome em ascensão da direita tradicional na corrida presidencial para o pleito de 2022, Xavier Bertrand também denunciou a confrontação entre os franceses “no risco de guerra civil”. Já o projeto de lei contra o separatismo proposto pelo governo Emmanuel Macron para combater o radicalismo islâmico no país foi elaborado sob o tema do agravamento dos conflitos na sociedade.

Adam Bazcko, especialista em sociologia de guerras civis do Centro Nacional de Pesquisas Sociais (CNRS, na sigla em francês), descarta qualquer possibilidade de uma guerra civil no país e define este atual mantra francês como um pretexto para transformar instituições públicas e de poder em um viés autoritário.

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