Arquivo da categoria: Cultura

Marie NDiaye: romancista francesa fala de identidade e de sua escrita da ambiguidade

Marie NDiaye em seu apartamento em Paris. Fotos: ©Fernando Eichenberg

FERNANDO EICHENBERG / REVISTA QUATRO CINCO UM

PARIS — Por volta dos 10 anos, Marie NDiaye foi presenteada por sua mãe, professora de Ciências, com a Petite Internationale, uma pequenina máquina de escrever de plástico, concebida especialmente para crianças. Nessa época, descobriu o livro Them, da escritora americana Joyce Carol Oates, obra que a mãe, voraz leitora, havia tomado emprestado na biblioteca. “Foi um tipo de epifania. Saí transformada dessa leitura. Compreendi o que era possível criar com as palavras, e queria fazer igual. Esse livro mudou minha vida”, conta NDiaye, hoje aos 57 anos, assentada no sofá de seu apartamento em Paris, próximo à Place de la Nation. Tornar-se escritora não emergiu como uma interrogação, mas uma evidência, diz ela. Mais tarde, adolescente, ganhou de sua tia uma enorme e pesada máquina de escrever profissional. “Minha tia trabalhava em um banco, que modernizou a agência e descartou vários equipamentos. Foi uma grande felicidade ter essa bela máquina. Era como um grande e velho carro que funcionava bem. E fazia muito ruído”, relembra. Entre os 12 e 15 anos, se aventurou nas literaturas americana, russa e sul-americana, e tentava, a sua maneira, copiá-las. Ao ler Gabriel García Márquez, escreveu uma breve ficção que se passava na Colômbia. “Gostei imensamente de García Márquez, dessa erupção do fantástico na vida mais ordinária de pessoas comuns. Sempre fui muito atraída por essa mistura entre o fantástico e o real”, admite.

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ENTREVISTA COM O ESCRITOR MOHAMED MBOUGAR SARR

FERNANDO EICHENBERG/ QUATRO CINCO UM

PARIS – Ao encerrar em Lisboa, em junho, sua longa turnê de 65 shows em nove meses, Chico Buarque voou rumo a Paris para merecidos dias de descanso antes de retornar ao Brasil. Da estante de sua morada na capital francesa, retirou um livro adormecido, que havia ganhado de presente de aniversário no ano passado: La plus secrète mémoire des hommes, do escritor senegalês Mohamed Mbougar Sarr. Aberta a primeira página, não conseguiu mais parar a leitura. “É simplesmente maravilhoso! Ele escreve maravilhosamente bem, e além do mais é engraçado, tem humor. Após ler esse livro, não sei como poderei voltar a escrever novamente”, exagerou o escritor laureado com o prestigioso prêmio literário Camões, sem esconder seu vivo entusiasmo.

Sarr não seduziu com sua escrita apenas o escritor brasileiro, mas também o exigente júri do Goncourt, o mais importante prêmio literário francês. A mais recôndita memória dos homens, assim traduzido e recém-lançado no Brasil pela editora Fósforo, foi apontado vencedor do Goncourt em 2021, por unanimidade, e desde então tem acumulado elogios da crítica e conquistado leitores pelo mundo.

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TEATRO: Christiane Jatahy EM alta voltagem

Foto: © Leo Aversa

FERNANDO EICHENBERG/ REVISTA PIAUÍ

PARIS – Em 2007, a diretora de teatro Christiane Jatahy foi uma das convidadas do Festival de Viena, um prestigiado evento de artes que acontece todo ano na capital austríaca. A encenadora carioca e sua trupe apresentaram a peça A Falta que Nos Move, que tinha por tema as complicadas relações familiares. O espetáculo começava de maneira inusitada: com a informação de que um dos atores não tinha chegado para a apresentação. A ideia era que a notícia fosse dada ao público do modo o mais realista possível, levando a crer que o elenco estava realmente desfalcado.

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RIP: BRUNO LATOUR (1947-2022)

Foto: ©Fernando Eichenberg/2013

FERNANDO EICHENBERG

Tive a chance de conversar com o pensador francês Bruno Latour uma vez em Paris, para uma entrevista para o jornal O Globo. Além de suas bem-vindas reflexões sobre o mundo moderno, tenho a vívida lembrança de de sua extrema generosidade e bom humor em nosso encontro, em sua sala no Instituto de Estudos Políticos de Paris (Sciences-po). O incansável intelectual nos deixou neste 9 de outubro de 2022, aos 75 anos, vitimado pelo câncer. A seguir a entrevista publicada no jornal e também no segundo volume de meu livro de entrevistas “Entre Aspas – vol 2” (ed. L&PM).

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RIP: J.-L. GODARD (1930-2022)

Jean-Luc Godard em 1998. ©Richard Dumas/Agence VU

FERNANDO EICHENBERG/HEADLINE

PARIS – Na última vez em que vi Jean-Luc Godard pessoalmente, ele estava sentado em uma mesa do café parisiense Le Select. O local não poderia ser mais emblemático. Reduto de artistas e intelectuais no século passado, o célebre estabelecimento do número 99 no boulevard Montparnasse acolheu em suas mesas nomes como os de Luis Buñuel, Sergei Eisenstein, Vladimir Nabokov, Ernesty Hemingway, Samuel Beckett, Henry Miller, Anaïs Nin, Isadora Duncan, Allen Ginsberg, Jack Kerouac, William Burroughs, Salvador Dalí, Joan Miró, Erik Satie, Jean Cocteau, entre tantos outros. Godard era um dos habitués do café. Mais do que isso, filmou ali uma das cenas do cult Acossado. Naquela tarde, ele estava solitário, um jornal fechado sobre a mesa, um fumegante charuto à boca, o olhar vago mirando o movimento da rua. Depois que paguei a minha conta, no caminho de saída parei diante de sua mesa, ele levantou a cabeça e me encarou com seus óculos de espessas lentes. Eu disse que ele certamente não lembraria de mim, e me apresentei como um jornalista brasileiro que um dia o havia entrevistado, e que guardava uma bela lembrança de nosso encontro. Ele disse uma ou duas palavras simpáticas, mas deixando claro que não desejava ser incomodado, e me despedi.

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RIP: Sempé (1932-2022)

Sempé em sua casa, em Paris. FOTOS: © Fernando Eichenberg

FERNANDO EICHENBERG

Certa vez, em um domingo flanava pelo bulevar Montparnasse, em Paris, na companhia dos queridos amigos Luis Fernando Verissimo e Lúcia, e comentei que há pouco tempo havia entrevistado o grande Sempé em sua casa, no último andar de um prédio ali perto de onde estávamos. Verissimo, fã do desenhista francês, de pronto respondeu positivamente à minha pergunta se gostariam de conhecer o endereço. Caminhamos alguns minutos e logo estávamos em frente ao prédio. Mostrei o interfone, e recordo de Verissimo olhando para o alto, tentando imaginar, talvez, naquele momento o incansável Sempé debruçado em sua mesa, lápis à mão, criando mais uma de suas obras-primas. Havia entrevistado Sempé para o hoje extinto caderno Prosa & Verso, de O Globo. Recebido generosamente pelo anfitrião, além da ótima conversa, aproveitei para, com o seu consentimento, metralhar com minha câmera o personagem e o entorno. Jeans-Jacques Sempé nos deixou nesta quinta-feira, 11 de agosto. Aqui o resultado de nosso encontro, também publicado no segundo volume de meu livro de entrevistas, “Entre Aspas 2” (L&PM).

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RIP: PETER BROOK (1925-2022)

FERNANDO EICHENBERG

Tive a chance de entrevistar o grande diretor de teatro Peter Brook, que nos deixou no sábado 2 de julho de 2022, aos 97 anos bem vividos, em três oportunidades: duas delas para a revista Bravo! e outra para o Teatro Sesc. Aqui o resultado de nossos encontros, publicado no primeiro volume de meu livro de entrevistas ‘Entre Aspas vol.1″ (LP&M).

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Em outubro de 1990, o diretor de teatro Peter Brook foi entrevistado no programa Le Bon Plaisir, da rádio francesa France-Culture. “O senhor aceitou essa entrevista mesmo tendo declarado um dia que jamais responderia as perguntas dos outros, só daria respostas as suas próprias interrogações. E então?”, questionou a jornalista Béatrice Clérc. O sábio Brook, já apelidado de Buda por seus atores, tratou de se explicar: “Tenho um primeiro princípio fundamental: nunca se apegar ao que dissemos no passado. Quando dizemos algo, é num dado momento, e no dia seguinte poderá ser exatamente o contrário. As contradições existem, mas se na vida adicionarmos todas elas, chegaremos a uma certa verdade”. Brook – na época, pelo menos – seguia ainda uma segunda conduta, também revelada a sua entrevistadora: “Meu outro princípio é o de nunca sentir que é preciso dizer a verdade aos jornalistas. Eles têm uma profissão que é a de fazer perguntas. Se as respondemos é em função das circunstâncias. Assim, por exemplo, diante de você, tratarei de ser relativamente honesto, não mais do que isso”.

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em paris, CRISTIANA REALI LEVA os combates de SIMONE VEIL PARA O PALCO

©Pascalito

FERNANDO EICHENBERG / O GLOBO

PARIS – A atriz brasileira Cristiana Reali está de volta aos palcos franceses após uma longa pausa forçada pela pandemia da Covid-19. E retornou encarnando uma das personagens mais emblemáticas, populares e admiradas na França : Simone Veil (1927-2017), sobrevivente de Auschwitz, defensora dos direitos das mulheres, autora da lei que legalizou o aborto no país, primeira presidente eleita do Parlamento Europeu e arauto da reconciliação e construção europeia no pós-Segunda Guerra. Um ano após a sua morte, aos 89 anos, foi entronizada no Panteão, célebre monumento onde repousam as grandes personalidades nacionais.

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christiane jatahy abrirá festival de avignon com peça que reflete intolerâNcia e ódio e tendo O brasil atual como pano de fundo

Ensaio da montagem que a diretora brasileira Christiane Jatahy vai fazer de Entre chien et loup (entre cachorro e lobo, em tradução literal) , uma livre adaptação do filme “Dogville”, na 75ª edição do Festival de Avignon . Fotos dos ensaios: ©Magali Dougados

FERNANDO EICHENBERG / O GLOBO

PARIS – A 75ª edição do Festival de Avignon, uma das mais importantes manifestações cênicas internacionais, será aberta este ano pela mais recente criação da brasileira Christiane Jatahy, artista constantemente prestigiada nos palcos europeus. Tendo como pano de fundo a atual situação política e social brasileira, “Entre chien et loup” (entre cachorro e lobo, em tradução literal) reflete sobre a intolerância e as raízes do ódio e do mal na vida em comunidade, em um alerta teatral e real para a ameaça dos extremismos no mundo.

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A partir de arquivos inéditos, nova biografia mostra um sartre avesso ao engajamento políticO, divertido e sonhador

Correspondência privada e arquivos de áudio e vídeo revelam um outro Sartre. ©AFP

FERNANDO EICHENBERG/ REVISTA ÉPOCA

PARIS – E se o filósofo francês Jean-Paul Sartre (1905-1980), símbolo maior do intelectual engajado do século XX, implicado nas principais lutas sociais e conflitos internacionais pós-Segunda Guerra Mundial, no fundo, não era assim tão entusiasta de seu ativismo político? “Na verdade, a política me enche o saco”, desabafou Sartre a sua amante russa, Lena Zonina, em uma carta de janeiro de 1963. François Noudelmann, estudioso de Sartre há 20 anos, encontrou várias confidências similares nos arquivos inéditos a que teve acesso, cedidos pela filha adotiva do filósofo, Arlette Elkaïm, morta em 2016. Continue lendo A partir de arquivos inéditos, nova biografia mostra um sartre avesso ao engajamento políticO, divertido e sonhador

Festival Panorama: cancelado no Brasil, evento de dança é abrigado na França

“O samba do crioulo doido”, de Luiz de Abreu, será apresentado no Panorama francês por Calixto Neto. ©Gil Grossi

FERNANDO EICHENBERG / O GLOBO

PARIS – Cancelada no ano passado no Rio, a 28ª edição do Festival Panorama, mais tradicional evento de dança e performance do país, foi resgatada pela França. O Centre National de la Danse (CND), instituição pública criada por iniciativa do Ministério da Cultura francês, promove o festival em suas instalações em Pantin, no subúrbio de Paris, de 5 a 21 deste mês. O convite é oficialmente assumido pelos anfitriões como “uma reação às medidas populistas do governo de Jair Bolsonaro”, que “levaram à anulação da edição 2019”, e uma afirmação da “solidariedade internacional” e da definição de arte como “pleno ato de resistência”. Continue lendo Festival Panorama: cancelado no Brasil, evento de dança é abrigado na França

RIP Claude Régy (1923-2019)

Claude Régy: “Muitas pessoas vêm escutar a música que esperam, ver a pintura que esperam, ver o teatro que esperam. Elas gostam de rever o que já viram, e não apreciam que as tiremos de seus limites do conhecido, porque é algo seguro, não há aventura”. ©Joël Saget/ AFP

PARIS – O diretor de teatro francês Claude Régy, fundador de uma nova estética na dramaturgia, morreu na noite do último dia 25, aos 96 anos de idade. Certa vez, fiz uma longa entrevista com ele aqui em Paris, para a revista Bravo!, por ocasião de sua montagem de 4.48 Psicose, texto da inglesa Sarah Kane (1971-1999), em cartaz no Théâtre des Bouffes du Nord, que seria também apresentada em São Paulo. Lembro que ao nos despedirmos em seu apartamento, que se destacava por conter apenas o mínimo essencial para uma vida cotidiana – uma escolha sua -, me perguntou por qual das escadas havia subido até o seu andar. Diante da minha resposta, me aconselhou a descer por uma outra: “Os degraus em que você pisará também foram usados por Jean-Jacques Rousseau, quando era preceptor de um jovem neste mesmo prédio”, disse. Desci cuidadosamente pela desgastado mármore da escadaria pensando nos passos do célebre filósofo do século XVIII. O ator Gérard Depardieu, que debutou no teatro sob a direção de Claude Régy, o definia como o “apóstolo do silêncio, da penumbra e do despojamento”.

Aqui o texto que escrevi, na época, para a revista. Continue lendo RIP Claude Régy (1923-2019)

Francis Bacon ganha retrospectiva no Centro Pompidou, em Paris

Retrospectiva de Francis Bacon relaciona escritos de Ésquilo, Nietzsche, T. S. Eliot, Joseph Conrad, Georges Bataille e Michel Leiris com as obras do artista. Fotos ©Fernando Eichenberg

FERNANDO EICHENBERG

PARIS – O pintor anglo-irlandês Francis Bacon (1909-1992), um dos artistas mais celebrados da segunda metade do século XX, rejeitava com vigor a onipresente classificação de suas criações como uma obra caracterizada pela temática da violência: “Não se pode jamais esquecer que um quadro não pode ser tão violento como a própria vida. E a vida é tão violenta…”. Diante de seus portraits disformes e distorcidos e de suas criaturas entre o humano e o animalesco, o rótulo colou com indolência como um sentimento geral, mesmo contra a sua vontade. Continue lendo Francis Bacon ganha retrospectiva no Centro Pompidou, em Paris

Como a brasileira Simone Menezes se tornou uma das poucas (e mais importantes) regentes de orquestra no mundo

Simone Menezes vive em Lille, no norte da França, de onde viaja para atuar como regente convidada em diferentes países. © Bruno Bonansea

FERNANDO EICHENBERG / O GLOBO

PARIS –  Tornar-se regente de orquestra não foi um plano precocemente concebido pela brasiliense Simone Menezes. Seu destino acabou sendo composto em uma partitura de forma quase natural. Aos seis anos de idade, já estudava piano. Três anos mais tarde, ensinava flauta para crianças de sua vizinhança, porque não via graça em tocar sozinha o instrumento. Aos 20, ainda durante sua graduação, criou a Orquestra Sinfônica Jovem da Unicamp e assumiu como regente assistente da Orquestra Sinfônica da USP. Naquela época, não havia se conscientizado de que estava adentrando em uma profissão predominantemente masculina, em que uma mulher com uma batuta na mão era percebida como uma ousadia e um comportamento inapropriado. Continue lendo Como a brasileira Simone Menezes se tornou uma das poucas (e mais importantes) regentes de orquestra no mundo

Louvre devolve quadro espoliado pelos nazistas

A tela espoliada pelos nazistas durante a Segunda Guerra Mundial será devolvida hoje aos descendentes de seus legítimos proprietários. ©Reprodução

FERNANDO EICHENBERG / O GLOBO

PARIS – O Museu do Louvre acolherá nesta segunda-feira uma cerimônia rara: a restituição de um quadro certificado como espoliado pelos nazistas durante a Segunda Guerra Mundial. O tríptico “A Crucificação”, atribuído ao pintor renascentista flamengo Joachim Patinir (1480-1524), será entregue pelas mãos da ministra da Cultura francesa, Françoise Nyssen, aos descendentes de Henry e Hertha Bromberg. Continue lendo Louvre devolve quadro espoliado pelos nazistas

Contra a intolerância, “Diário de Anne Frank” é lançado em quadrinhos

FERNANDO EICHENBERG / O GLOBO

PARIS – Quando foi contatado pela Fundação Anne Frank para realizar um filme de animação e uma história em quadrinhos baseados no célebre diário da jovem judia que permaneceu escondida durante a Segunda Guerra Mundial e acabou morrendo, aos 15 anos, no campo de concentração nazista de Bergen-Belsen, o cineasta israelense Ari Folman foi categórico em sua resposta: “Não”. Continue lendo Contra a intolerância, “Diário de Anne Frank” é lançado em quadrinhos

Max Gallo (1932-2017): um intelectual apaixonado pela história da França

© Philippe Dobrowolska

FERNANDO EICHENBERG / O GLOBO

PARIS – A primeira máquina de escrever do jovem Max Gallo foi um presente de seu pai, ofertada com a seguinte frase: “Você poderá ganhar grandes batalhas com isso”. Ele não somente ouviu como adotou o conselho paterno ao se tornar um dos maiores nomes das letras e da historiografia francesa, reconhecido internacionalmente por seus romances, biografias e ensaios históricos. Escritor incansável, autor de uma centena de obras, Max Gallo faleceu ontem em Paris, aos 85 anos, após um longo combate contra a doença de Parkinson. Continue lendo Max Gallo (1932-2017): um intelectual apaixonado pela história da França

Christiane Jatahy: primeiro nome brasileiro a dirigir um espetáculo na Comédie-Française

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Christiane Jatahy começa neste novembro os ensaios para a “A Regra do Jogo”, na Comédie-Française. ©Marcelo Lipiani

FERNANDO EICHENBERG / FOLHA DE SÃO PAULO

PARIS – Christiane Jatahy observa os despidos muros de sua provisória morada em Paris e confidencia, inconformada: “Preciso continuar construindo minhas estantes. Sempre tive um prazer enorme de ficar admirando uma biblioteca, adoro a ideia de paredes repletas de livros, é algo que me apazigua”. Nascida em 1968, ela viveu a primeira parte de sua infância carioca de forma bastante solitária, imersa em numerosas leituras que estimularam sua imaginação e forjaram sua “sensibilização e o olhar para o mundo”. No segundo ato, até os 14 anos, a família avolumou, e o aspecto coletivo se afirmou pelo teatro. Com tios, primos e outros parentes, encenava peças para serem apresentadas nas celebrações familiares, em aniversários ou festejos natalinos. Na juventude, veio a descoberta da filosofia e do cinema, com sessões ininterruptas em cineclubes das 14h às 22h. Adulta, passou a criar no Brasil seus próprios espaços cênicos, mas, principalmente, a quebrar barreiras. Hoje, aos 48 anos, impõe-se com seus singulares espetáculos teatrais nos palcos da Europa, e se prepara para conquistar os Estados Unidos. Continue lendo Christiane Jatahy: primeiro nome brasileiro a dirigir um espetáculo na Comédie-Française

Richard Avedon e a França: uma história de amor e de imagens

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A atriz Catherine Deneuve fotografada por Richard Avedon, em 1968. © The Richard Avedon Foundation

FERNANDO EICHENBERG

PARIS –Foi por terror que me tornei um artista. Tudo o que quando criança, e mesmo adulto, não conseguia controlar – o tempo, o movimento, os outros, seus apetites, os meus -, podia captar por meio da minha máquina fotográfica. Esta caixa preta se tornou minha cúmplice, minha co-inspiradora”. O célebre fotógrafo americano Richard Avedon (1923-2004) ganhou de presente sua primeira Rolleiflex aos dez anos de idade, e fez da fotografia sua arte e sua profissão. A Biblioteca Nacional da França (Bnf) inaugurou na semana passada uma bela exposição sobre a intensa relação do artista com a França, com cerca de 200 imagens. Continue lendo Richard Avedon e a França: uma história de amor e de imagens

Louvre renovado prepara novas exposições e enfrenta a ameaça terrorista na França

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Jean-Luc Martinez, presidente do Louvre: “Sou um daqueles que acreditam que o belo pode salvar o mundo”. ©Museu do Louvre/Florence Brochoire

FERNANDO EICHENBERG / O GLOBO

PARIS — O Museu do Louvre, o primeiro do mundo em termos de frequência, deverá perder até cerca de 2 milhões de visitantes este ano, o equivalente a mais de 20% do total de seu atual público. A queda, estimada pelo presidente da célebre instituição francesa, Jean-Luc Martinez, 52 anos, é creditada principalmente aos efeitos colaterais dos recentes atentados e da constante ameaça terrorista na França. Para conter este decréscimo, além de reforçar a segurança local, o museu intensificou as ações de divulgação de sua imagem no exterior. Foi lançado, inclusive, o projeto de uma grande exposição no Rio e em São Paulo durante os últimos Jogos Olímpicos, mas, apesar dos esforços, sem alcançar concretização. Os brasileiros são, hoje, a quarta nacionalidade estrangeira de maior frequentação do museu, atrás dos italianos, chineses e, no topo, os americanos. A média de tempo de visita do público brasileiro, de 3h10min de duração, está, inclusive, acima da média geral, de 2h42min. Continue lendo Louvre renovado prepara novas exposições e enfrenta a ameaça terrorista na França

Maria Ribeiro e Matilde Campilho: uma conversa entre a cronista e a poeta

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A poeta portuguesa Matilde Campilho (à esquerda) e a cronista e atriz carioca Maria Ribeiro no encontro em Lisboa. © Fernando Eichenberg

FERNANDO EICHENBERG / O GLOBO

LISBOA – Uma é carioca, atriz, documentarista e cronista, 40 anos de vida, assume sua vaidade, as redes sociais, tem medo de avião, e gosta de inverno. A outra é portuguesa, poeta, 33 anos, evita a exposição, não tem Instagram, é andarilha, e gosta de verão. A primeira, Maria Ribeiro, viajou do Rio a Lisboa para o lançamento da edição portuguesa de sua compilação de crônicas, “Trinta e Oito e Meio” (lançado no Brasil pela ed. Língua Geral), e finaliza o livro “40 Cartas e um Email que Nunca Mandei” (ed. Planeta), que será lançado no início do ano que vem. A segunda, Matilde Campilho, vive hoje em Lisboa após uma temporada de três anos no Rio – de 2010 a 2013 -, e está na quinta edição lusitana de sua primeira obra de poemas, “Jóquei” (ed. Tinta da China; no Brasil, o livro foi lançado pela ed. 34). Além das diferenças de temperamento, as duas mantêm uma nítida convergência de interesse: a escrita. O Globo reuniu as duas escritoras em Lisboa para uma descontraída conversa nestes tempos de crescentes intercâmbios literários luso-brasileiros. Prova disso é que elas voltarão a se encontrar em novembro, quando Matilde Campilho mediará na cidade do Porto o debate do projeto “Você é o que lê”, que além de Maria Ribeiro conta ainda com Xico Sá e Gregório Duvivier. Continue lendo Maria Ribeiro e Matilde Campilho: uma conversa entre a cronista e a poeta

O amor à linguagem do múltiplo Roland Barthes

Foto: Jerry Bauer
Foto: Jerry Bauer

FERNANDO EICHENBERG / FOLHA DE S. PAULO

PARIS – Pela multiplicidade de seu pensamento, Roland Barthes, cujo centenário se comemorou no dia 12, é às vezes visto como vulgarizador de conceitos. Especialistas destacam sua visão aberta e não assertiva e sua atenção pioneira ao signo como chaves para entender por que a obra do autor, morto em 1980, permanece atual.

No último dia 12, se estivesse vivo, Roland Barthes teria completado cem anos. Na tarde de 25 de fevereiro de 1980, após um almoço com o então aspirante a presidente François Mitterrand – ele seria eleito no ano seguinte – Barthes foi atropelado por uma caminhonete de lavanderia, próximo ao Collège de France, na rua des Écoles, em Paris.


Era um dia “frio, amarelo”,
anotara em sua agenda pela manhã.


Morreu um mês depois, em 26 de março, num leito do hospital Pitié-Salpêtrière, em estado de coma agravado por complicações pulmonares causadas por uma insuficiência respiratória crônica, fruto de sua tuberculose adolescente.

A efeméride do centenário do nascimento gerou ao longo deste ano uma infinidade de eventos e publicações sobre a vida e a obra do célebre pensador, escritor, crítico literário e semiólogo francês. E evocou o legado intelectual do autor de ensaios como “O Grau Zero da Escrita” (1953), “Mitologias” (1957), “O Sistema da Moda” (1967), “S/Z” (1970), “O Prazer do Texto” (1973), “Roland Barthes por Roland Barthes” (1975), “Fragmentos de um Discurso Amoroso” (1977) ou “A Câmara Clara” (1980).