Arquivo da categoria: França

Patrimônio devastado: incêndio na Catedral de Notre-Dame emociona a França e o mundo

País em choque: Bombeiros lutam para controlar as chamas que destroem parte da Catedral de Notre-Dame, em Paris: autoridades supõem que fogo começou no canteiro de obras de restauração no topo da emblemática igreja. ©Yann Castanier/Hans Lucas

FERNANDO EICHENBERG / O GLOBO

PARIS – Apoiada em uma murada da Pont Neuf, a parisiense Virginie Bastier, 55 anos, não continha as lágrimas diante das chamas que consumiam o telhado e as entranhas da catedral de Notre-Dame, no início da noite de ontem.

– Estou transtornada – disse, soluçando. – Para mim, é mais do que um símbolo, é um monumento vivo, é a alma de Paris. Esta catedral resistiu à Revolução Francesa, às guerras. Moro aqui ao lado, uma amiga me ligou avisando e vim ver. Estou rezando para que sobre algo. Continue lendo Patrimônio devastado: incêndio na Catedral de Notre-Dame emociona a França e o mundo

Frente a revolta, opções de Macron se estreitam

Manifestantes durante os protestos dos ‘coletes amarelos’ no sábado passado: presidente francês está sendo forçado a mudar seu estilo de governança . © Benoit Tessiier/Reuters 

FERNANDO EICHENBERG / O GLOBO

PARIS – Os coletes amarelos sairão hoje às ruas da França no 19° sábado consecutivo de manifestações desde novembro, em um inédito movimento de protesto no país. A revolta, deflagrada por reivindicações de justiça fiscal e social e marcada por momentos de extrema violência, forçou o presidente Emmanuel Macron a mudar seu estilo de governança e a organizar um amplo debate nacional, encerrado no último dia 15, para acolher as principais demandas dos franceses. Mas, na opinião de analistas, pressionado pela radicalização dos protestos e o risco de frustrar as expectativas com as medidas resultantes do chamado Grande Debate, o líder francês não está próximo de terminar com seus problemas, e suas opções para solucionar esta interminável crise encolhem a cada dia. Para este sábado, o governo decidiu fortalecer o dispositivo repressivo face às manifestações. Continue lendo Frente a revolta, opções de Macron se estreitam

Macron muda de estilo para sobreviver a protestos na França

Macron faz uma selfie com estudantes durante encontro como parte do Grande Debate Nacional, em Etang-sur-Arroux. © Emmaneul FoudrotT/Reuters

FERNANDO EICHENBERG / O GLOBO

PARIS – A revolta dos coletes amarelos na França, em manifestações pelo país desde novembro, obrigou o presidente Emmanuel Macron a alterar seu método de governança. Saiu o presidente jupiteriano que se reivindicava como o mestre do tempo e dizia que manteria seu ritmo de reformas a todo custo, em uma forma de governar sem os vícios do passado e acima das pautas da mídia. Encurralado pelas ruas e de olho nas eleições europeias, assumiu o líder que, de mangas arregaçadas, têm feito maratonas de debates com prefeitos ou estudantes em discursos de tom conciliador, em uma tentativa de se desvencilhar da imagem arrogante de “presidente dos ricos” que lhe colou desde seus primeiros meses no poder. Para analistas, o novo estilo presidencial contribui para estancar sua queda de popularidade, mas a sobrevivência do governo Macron dependerá das consequências práticas da consulta popular nacional lançada pelo governo, com término em 15 de março, e dos resultados das urnas no pleito para o Parlamento Europeu, em 26 de maio. Continue lendo Macron muda de estilo para sobreviver a protestos na França

L’Humanité, centenário jornal da esquerda francesa, luta para sobreviver em meio à grave crise financeira

Homem vende o L’Humanité em frente a um café, em Pantin, subúrbio de Paris, em 12 de abril de 1959. © Mémoires d’Humanité / Archives départementales de la Seine-Saint-Denis

FERNANDO EICHENBERG / REVISTA ÉPOCA

PARIS – Rosa Moussaoui entrou para o jornal L’Humanité em 2004, ano do centenário da histórica publicação francesa. “Estou aqui há 15 anos por convicção. É um jornal enraizado nas lutas sociais, na solidariedade internacional e um reflexo de combates ecologistas e feministas. Essa identidade política é extremamente importante para mim. Esse jornal sempre sobreviveu pela vontade daqueles que o fazem e o leem”, diz, assentada na redação situada no número 5 da rua Pleyel, em um moderno complexo de escritórios em Saint-Denis, subúrbio norte de Paris. O tom militante emerge da crise vivida nestas semanas pelo jornal. A secular aventura do L’Humanité, afundado em dívidas, esteve ameaçada de chegar ao fim. No último dia 7, no entanto, o Tribunal de Bobigny concedeu uma sobrevida à publicação e aceitou o pedido de recuperação judicial, com permissão de continuar em atividade por um período de observação de seis meses. Uma nova audiência está marcada para o dia 27 de março. Continue lendo L’Humanité, centenário jornal da esquerda francesa, luta para sobreviver em meio à grave crise financeira

Muçulmanas reivindicam igualdade de tratamento entre homens e mulheres nas mesquitas da França

Kahina Bahloul diz que a separação entre homenes e mulheres não tem sentido: “É um tipo de esquizofrenia. Hoje todos os dias homens e mulheres estão juntos no trabalho, na escola, na universidade”. Foto: Divulgação

FERNANDO EICHENBERG / O GLOBO

PARIS – Na vez em que foi orar na prestigiosa Grande Mesquita de Paris, Kahina Bahldoul se viu relegada a uma desconfortável sala no subsolo, adjacente ao banheiro masculino, onde mal se ouvia o imã que pregava exclusivamente para os homens no recinto principal, um andar acima, ao qual o acesso das mulheres era proibido.

Mas vivi uma experiência ainda pior — conta ela. — Fomos em um grupo, homens e mulheres, a uma mesquita nos arredores de Paris. Ao chegarmos, disseram para nós, mulheres: “Atravessem a rua e encontrarão uma garagem, lá é o lugar de vocês”. Ainda por cima, era uma data de festa religiosa. Na garagem, era péssima a transmissão do sermão pelo alto-falante. Foi algo extremamente desagradável, me senti insultada. A partir daquele dia, decidi não frequentar mais mesquitas e passei a fazer minhas orações em casa.Kahina Bahloul diz que a separação de homens e mulheres não tem sentido: “É um tipo de esquizofrenia. Hoje todos os dias homens e mulheres estão juntos no trabalho, na escola, na universidade” . Continue lendo Muçulmanas reivindicam igualdade de tratamento entre homens e mulheres nas mesquitas da França

Guerrilheiros da memória: a luta de um casal francês para colocar na cadeia genocidas de Ruanda

Dafroza e Alain Gauthier combatem há 20 anos a impunidade dos participantes do genocídio de Ruanda. © Fernando Eichenberg

FERNANDO EICHENBERG / REVISTA ÉPOCA

REIMS – À primeira vista, Alain e Dafroza Gauthier formam um casal de aposentados em uma vida pacata e aprazível em Reims, a capital do champanha no nordeste da França. Ela, 64 anos, ex-engenheira química, e ele, 69, ex-professor de francês, residem em uma casa de amplas janelas e um belo terraço, onde costumam receber a visita dos três filhos, de 38, 35 e 30 anos. Mas, além das aparências, seu cotidiano se assemelha a uma complexa e interminável trama detetivesca. Há cerca de 20 anos, o casal Gauthier vive seus dias mergulhado em uma única missão: desmascarar na França suspeitos de terem participado do genocídio de Ruanda, em 1994, e denunciá-los à Justiça. Continue lendo Guerrilheiros da memória: a luta de um casal francês para colocar na cadeia genocidas de Ruanda

R.I.P. Charles Aznavour (1924-2018)

Fotos © Fernando Eichenberg

Entrevistei Charles Aznavour às vésperas de sua viagem ao Brasil, em 2008, em meios aos shows de sua turnê comemoratriva dos 75 anos. Ele me recebeu na sede da editora de músicas Raoul Breton, no 67 bulevar de Courcelles,  em Paris, simpático, brincalhão, e sempre dedicado à sua paixão maior, a canção.

Abaixo a entrevista, publicada no segundo livro de meu livro de entrevistas, “Entre Aspas 2” (ed. L&PM). Continue lendo R.I.P. Charles Aznavour (1924-2018)

Tobie Nathan: “Não há mais imigrações de ruptura”

Tobie Nathan: “Trabalhei com uma escola em Aubervilliers (subúrbio norte de Paris), e numa classe havia 40 alunos, sendo 35 do mesmo pai. Isso não é um melting pot, é uma outra coisa, que exige uma outra reflexão e proposição”. © Fernando Eichenberg

FERNANDO EICHENBERG / O GLOBO

PARIS — As imigrações do passado se transformam cada vez mais em diásporas do presente. Para sair da crise atual, a Europa deverá repensar sua coexistência com o estrangeiro e levar em conta as formas de mobilidade contemporâneas. A negação da alteridade estimula os conflitos, e a laicidade francesa é incapaz, hoje, de gerir uma convivência pacífica dos monoteísmos. As opiniões são de Tobie Nathan, um dos herdeiros de Georges Devereux (1908-1985), considerado fundador da etnopsiquiatria, prática que combina a psicologia clínica com a antropologia cultural. Continue lendo Tobie Nathan: “Não há mais imigrações de ruptura”

Macron: um líder europeu à procura de liderados

Macron ao receber o Prêmio Charlemagne por seu “entusiasmo contagiante” pelo fortalecimento da UE: faltam parceiros. © Ludovic Marín/AFP

FERNANDO EICHENBERG / O GLOBO

PARIS – O presidente francês Emmanuel Macron se elegeu em 2017 como um ardente defensor da Europa, arauto de um ambicioso projeto de reformas nas políticas e instituições do continente. Após um ano no poder, no entanto, sua declarada pretensão de comandar uma refundação da União Europeia (UE) teima em conquistar adeptos, deixando-o na desconfortável situação de um solitário líder em meio à oposição de correntes nacionalistas, à desconfiança de eurocéticos e, principalmente, à resistência da Alemanha em endossar mudanças na zona euro. Hoje, um de seus principais aliados para motivar a reaproximação dos membros da UE seriam os Estados Unidos, por conta das importantes divergências geopolíticas e comerciais europeias com o presidente Donald Trump, cada vez menos inclinado ao diálogo transatlântico. Continue lendo Macron: um líder europeu à procura de liderados

Na “Bamako parisiense”, imigrantes malineses buscam sonho europeu

Birama Gassama, irmão mais velho do heroi Mamoudou. © Fernando Eichenberg

FERNANDO EICHENBERG / O GLOBO

PARIS – O assunto das conversas no centro de alojamento para trabalhadores migrantes do número 24, na rua Rochebrune, em Montreuil, no subúrbio leste de Paris, é monotemático: a façanha do malinês Mamoudou Gassama, 22 anos, que salvou uma criança de 4 anos pendurada na sacada de um apartamento na capital francesa. Antes de se tornar herói, Mamoudou era um imigrante ilegal que trabalhava clandestinamente e residia no abrigo, dormindo no chão de um quarto de cerca de 15 metros quadrados que dividia com dois irmãos e dois primos. Continue lendo Na “Bamako parisiense”, imigrantes malineses buscam sonho europeu

Maio de 1968 virou mito e contamina as lutas do presente na França

Em manifestação de estudantes professores, a pichação lembra os 50 anos de Maio de 1968: para o o filósofo e sociólogo Geoffroy de Lagasnerie,quanto menos um movimento se assemelhar, hoje, ao daquele ano, mais terá chances de ser eficaz . © Francois Mori/AP

FERNANDO EICHENBERG / O GLOBO

PARIS – O visitante que desembarcar, hoje, na França, e se deparar com universidades ocupadas por estudantes, greves de trabalhadores e confrontos com a polícia em manifestações de rua poderia, acidentalmente, pensar que retrocedeu no tempo até maio de 1968. As comparações das turbulências contemporâneas com o mítico mês que há 50 anos abalou o país e entrou para a História têm sido frequentes, mas de pronto contestadas pela facilidade de suas coincidências e por seu anacronismo. Em plena efeméride cinquentenária, no entanto, o contexto atual insuflou o debate sobre o legado de 68. Continue lendo Maio de 1968 virou mito e contamina as lutas do presente na França

“Não queremos repetir Cohn-Bendit”, dizem jovens ativistas franceses

Criação do Movimento 22 de Março, em Nanterre, em 1968, com a presença de Daniel Cohn-Bendit. ©Getty/ Gerard-Aime/Gamma-Rapho

FERNANDO EICHENBERG / O GLOBO

PARIS – Em 22 de março de 1968, cerca de 150 estudantes, liderados por Daniel Cohn-Bendit, ocuparam a Universidade Paris Nanterre, nos subúrbios da capital francesa, no episódio simbolicamente considerado como marco deflagrador do movimento que se expandiu pelo país no mês de maio. Os jovens exigiam a liberação de um militante contra a guerra do Vietnã, preso alguns dias antes em uma manifestação no centro de Paris, e também a livre circulação de estudantes dos sexos feminino e masculino nas residências universitárias. Neste maio de 2018, Paris Nanterre é uma das universidades ocupadas na França por estudantes contrários ao projeto de lei do governo que altera regras de admissão no ensino superior. Sem desmerecer conquistas de maio de 68, mas também críticos ao movimento, a nova geração de rebeldes evita equiparar suas lutas de hoje com as barricadas de 50 anos atrás. Continue lendo “Não queremos repetir Cohn-Bendit”, dizem jovens ativistas franceses

Cultura compartilhada: escola pública em Paris faz trabalho pedagógico contra antissemitismo e islamofobia com alunos

Sem tabus . Os professores Jacqueline Courier-Brière e Nasser Dja Bouabdallah em aula na escola parisiense:, que incentiva o diálogo positivo. © Fernando Eichenberg

FERNANDO EICHENBERG / O GLOBO

PARIS – Face à reverberação de discursos racistas, xenófobos, antissemitas e islamofóbicos na França, exacerbados após os atentados terroristas de 2015, uma escola pública parisiense e uma associação dedicada à amizade judeu-muçulmana se aliaram num trabalho pedagógico com alunos de diferentes origens e crenças para promover o “viver junto” e combater estereótipos e preconceitos. O colégio público Georges-Brassens, no 19° distrito da capital francesa, e a associação Bâtisseuses de Paix (Construtoras de Paz) reivindicam um projeto urgente em tempos de “comunitarismo”, de “importação do conflito Israel-Palestina”, e lamentam a falta de um “diálogo positivo” no ensino francês na abordagem destes temas. Continue lendo Cultura compartilhada: escola pública em Paris faz trabalho pedagógico contra antissemitismo e islamofobia com alunos

Nos arquivos secretos da diplomacia francesa

FERNANDO EICHENBERG / O GLOBO

PARIS – Em 22 de maio de 1980, o embaixador da França no Iraque, Pierre Rocalve, enviou de Bagdá para Paris o seguinte despacho diplomático ao então ministro das Relações Exteriores, Jean François-Poncet, traçando o perfil do líder do país no qual exercia o posto:Monsieur Saddam Hussein conquistou uma segurança e mesmo um certo carisma, criando um personagem feito de uma curiosa mistura, associando a vivacidade e o sorriso de Kennedy, a logorréia e o charuto de Fidel Castro, o penteado de Yasser Arafat, a energia e por vezes o guarda-roupa de Tito, o gosto pelo triunfo de Nasser, e também a grandiloquência de um imperador da Mesopotâmia“. O trecho acima revela que, além de detalhados relatórios geopolíticos, os diplomatas também sabem recorrer à criatividade de estilo ao transmitirem suas mensagens para a matriz. Continue lendo Nos arquivos secretos da diplomacia francesa

Urbanismo antiterror

Museu do Louvre ganhou blocos de concreto em seu entorno por questões de segurança. ©Alain Apaidyn/AP

FERNANDO EICHENBERG / O GLOBO

PARIS – A Torre Eiffel, um dos monumentos mais emblemáticos de Paris, em breve será circundada no solo por um muro de vidro à prova de balas, de três metros de altura, como parte dos dispositivos de segurança de prevenção à ataques terroristas. As obras da muralha envidraçada, ao custo de 20 milhões de euros, começarão no próximo dia 5, com conclusão prevista em 13 de julho de 2018, um dia antes da festa nacional francesa da Queda da Bastilha, quando a Torre se inflama em fogos de artifícios. Até lá, a célebre Dama de Ferro, permanecerá cercada de grades e de pórticos de segurança, com cabines de revistas de bolsas e mochilas para os visitantes. Continue lendo Urbanismo antiterror

Macron impõe novo estilo de governança

O presidente francês, Emmanuel Macron e a primeira-dama, Brigitte. ©Reuters

FERNANDO EICHENBERG / O GLOBO

PARIS – Instalado há dois meses no Palácio do Eliseu, o presidente Emmanuel Macron imprimiu um novo estilo de governo em relação a seus mais recentes predecessores. Em meio ao “macronismo” e à “macromania”, dois novos termos surgidos neste início de mandato, o líder francês estabeleceu de pronto uma governança repleta de simbolismos e de rígido controle de imagem, de comunicação e de funcionamento interno. Enquanto os temas mais polêmicos de seu quinquênio, como a reforma trabalhista, não entram no estágio decisivo dos debates e do confronto das ruas, Macron se afirma no cenário internacional e aplica novas regras presidenciais no nível doméstico, sustentado por altos índices de popularidade. Para analistas franceses, o chefe de Estado se distingue, principalmente, pela excelência de um estrategista e por uma estrita gerência da função, reivindicada em seus princípios soberanos. Continue lendo Macron impõe novo estilo de governança

Eleições 2017: a França de Macron ou de Le Pen

FERNANDO EICHENBERG / O GLOBO

PARIS – Depois de uma campanha tumultuada, coberta de escândalos e surpresas até o último minuto, os franceses irão finalmente decidir, neste domingo, pela eleição do centrista Emmanuel Macron ou pela ascensão de Marine Le Pen, líder da extrema-direita no país. Ambos representam destinos diametralmente opostos para a França e para a Europa pelos próximos cinco anos — e trazem seus desafios particulares no jogo de poder.

Terrorismo na “avenida mais bela do mundo”

Policiais das forças especiais vigiam o acesso à avenida após o ataque terrorista. ©Reuters

FERNANDO EICHENBERG  / O GLOBO

PARIS – Orgulhosamente denominada pelos franceses de “avenida mais bela do mundo”, a avenida de Champs-Elysées é um dos lugares mais emblemáticos de Paris e da História da França. Um ataque terrorista no local atinge não apenas a segurança dos cerca de 300 mil franceses e turistas que circulam diariamente por seus dois quilômetros de comprimento e 70 metros de largura. Trata-se de uma agressão triplamente simbólica, por ter ocorrido na celebrada avenida; contra policiais, agentes do Estado francês, e às vésperas de uma eleição presidencial. Continue lendo Terrorismo na “avenida mais bela do mundo”

“A balsa de Lampedusa” e o drama dos refugiados

balsa-de-lampedusa
A instalação “A balsa de Lampedusa”, do artista francês Pierre Delavie, no Rio Sena, em Paris.

Em 2016, 63.732 pessoas tiveram a entrada rejeitada na França, contra 15.849 no ano anterior, um significativo aumento de… 302%. O impressionante crescimento é fruto do recrudescimento do controle estabelecido nas fronteiras provocado pela constante ameaça terrorista e pela vaga de refugiados no continente. As questões em torno das políticas de imigração e de asilo e dos refugiados são temas centrais da campanha para as eleições presidenciais deste ano na França. Continue lendo “A balsa de Lampedusa” e o drama dos refugiados

“Le Canard Enchaîné” comemora 100 anos de sátira e de informação

canard1

FERNANDO EICHENBERG

PARIS – Ciosa de suas excecionalidades, a França celebra este ano o centenário do semanário “Le Canard Enchaîné”, jornal ao mesmo tempo satírico e investigativo, criado no longínquo 1916 (uma primeira tentativa ocorrera um ano antes, mas não sobreviveu a mais do que cinco edições, por causa da censura). Religiosamente nas bancas em todas as quartas-feiras, a publicação se ilustra por seu tom zombeteiro em relação às coisas da política, mas também por seus repetidos furos de reportagem e denúncias de escândalos no mundo do poder – como o conhecido caso dos diamantes oferecidos pelo ditador centro-africano Jean-Bedel Bokassa ao presidente francês Valéry Giscard d’Estaing nos anos 1970. Continue lendo “Le Canard Enchaîné” comemora 100 anos de sátira e de informação

Louvre renovado prepara novas exposições e enfrenta a ameaça terrorista na França

jean-luc-martinez3
Jean-Luc Martinez, presidente do Louvre: “Sou um daqueles que acreditam que o belo pode salvar o mundo”. ©Museu do Louvre/Florence Brochoire

FERNANDO EICHENBERG / O GLOBO

PARIS — O Museu do Louvre, o primeiro do mundo em termos de frequência, deverá perder até cerca de 2 milhões de visitantes este ano, o equivalente a mais de 20% do total de seu atual público. A queda, estimada pelo presidente da célebre instituição francesa, Jean-Luc Martinez, 52 anos, é creditada principalmente aos efeitos colaterais dos recentes atentados e da constante ameaça terrorista na França. Para conter este decréscimo, além de reforçar a segurança local, o museu intensificou as ações de divulgação de sua imagem no exterior. Foi lançado, inclusive, o projeto de uma grande exposição no Rio e em São Paulo durante os últimos Jogos Olímpicos, mas, apesar dos esforços, sem alcançar concretização. Os brasileiros são, hoje, a quarta nacionalidade estrangeira de maior frequentação do museu, atrás dos italianos, chineses e, no topo, os americanos. A média de tempo de visita do público brasileiro, de 3h10min de duração, está, inclusive, acima da média geral, de 2h42min. Continue lendo Louvre renovado prepara novas exposições e enfrenta a ameaça terrorista na França

Mitterrand: cartas para Anne, o amor clandestino

mitterrand_franc_ois_a_massevaques_en_loze_re_en_1
Foto de François Mitterrand feita por Anne Pingeot, em Massevaques, na região de Lozère, em 1978. ©Anne Pingeot

FERNANDO EICHENBERG/ ZERO HORA

PARIS –Amo minhas mãos que acariciaram teu corpo, amo meus lábios que beberam em ti. Amo teu corpo, tua alegria que se derrama em mim quando sinto tua boca, a possessão que me queima de todos os fogos do mundo, o jorro de meu sangue dentro de ti, teu prazer que surge do vulcão de nossos corpos, labaredas no espaço, abrasamento”. A incandescente e passional declaração é trecho de uma carta escrita em julho de 1970, de François para Anne. Ele é François Mitterrand (1916-1996), presidente da França de 1981 a 1995. Ela é Anne Pingeot, seu amor clandestino por mais de 30 anos. O grande amor de sua vida. Continue lendo Mitterrand: cartas para Anne, o amor clandestino

o fenômeno da Rentrée littéraire na frança

Rentrée4- Livraria L'Écume des Pages ©Fernando Eichenberg
A rentrée littéraire na livraria l’Écume des Pages. ©Fernando Eichenberg

FERNANDO EICHENBERG/ ZERO HORA

PARIS – O mês de setembro assinala o começo do outono na Europa. É o verdadeiro início do ano no continente depois das festejadas férias de verão. Janeiro é januarius, mês do deus Janus, representado por duas faces coladas e opostas, uma mirando para o passado, e a outra, na direção do futuro. Mas é no nono mês do calendário que as tradicionais agendas vendem como baguette quente, e as revistas exibem os mais previsíveis artigos sobre “as resoluções para o novo ano”. Depois do dolce far niente de agosto, o estresse logo se instala nos subterrâneos do metrô, novamente tumultuados, e nos semblantes de motoristas impacientes em meio aos frequentes engarrafamentos. Os ministros da República retornam ao debate político bronzeados pelo sol estival, as crianças se alvoroçam nos portões das escolas na volta às aulas, e a vida cotidiana, cultural e gastronômica retoma seu curso, já com as matizes de outono. O setembro francês é o março brasileiro. É o ano que (re)começa. Continue lendo o fenômeno da Rentrée littéraire na frança

Biquíni x burkini

Burkini Kroll
Charge do cartunista belga Kroll. Em 1966, o policial francês ordena: “Vista-se, madame, isso é proibido!”. E em 2016: “Dispa-se, madame, isso é proibido!“.

FERNANDO EICHENBERG/ ZERO HORA

PARIS – O verão em que a França celebra os 70 anos da criação do biquíni ficará marcado por um outro traje de banho, que poderia ser definido como sua antítese. Neste final da temporada estival europeia, todas as atenções se voltaram para o burkini, vestuário de praia islâmico que deixa visível apenas o rosto, as mãos e os pés, e alvo de polêmica nos últimos dias por sua interdição decretada em várias praias francesas. O biquíni, como se sabe, fez sua primeira aparição na capital francesa em 5 de julho de 1946, na piscina Molitor, pelas mãos de Louis Réard – engenheiro mecânico que administrava a loja de lingeries de sua mãe –, e vestido pela dançarina Micheline Bernardini – conhecida por suas performances desnudas na casa de espetáculos Casino de Paris. Já a invenção do burkini é creditada à australiana de origem libanesa Aheda Zanetti, que conta ter parido a ideia em 2004, em Sydney, ao ver sua sobrinha sofrendo ao praticar esporte coberta por um longo véu hijab. Continue lendo Biquíni x burkini

Nice: “Horrível, horrível”

Nice atentado
Serviços franceses socorrem as vítimas do ataque em Nice. ©Twitter

“Foi horrível, horrível, horrível”. Era só o que a brasileira Denise Barros, 37 anos, conseguia repetir após testemunhar a chacina provocada pelo ataque do caminhão em Nice, durante o espetáculo de fogos de artifício do 14 de julho, a data nacional da França. Maranhense, há dez anos na França, ela estava em Nice com o namorado francês para passar o feriado do 14 de julho, a data nacional da queda da Bastilha. Continue lendo Nice: “Horrível, horrível”

Paris: capital das manifestações

Eugène_Delacroix_-_La_liberté_guidant_le_peuple
“A liberdade guiando o povo” (1830), de Eugène Delacroix

Quem acompanha a atualidade francesa tem visto os incessantes protestos contra a nova legislação trabalhista do país. Uma passeata faz parte do cotidiano do parisiense assim como a Torre Eiffel no horizonte e a baguete matinal na padaria da esquina. A capital francesa é reconhecida como a capital mundial das manifestações de rua.

Ao longo de 2015 e no primeiro trimestre deste ano, ocorreu um total de 2.456 manifestações reivindicativas em Paris, uma média de mais de cinco por dia, segundo as fontes oficiais. Bandeiras e protagonistas não faltam: protestos contra o racismo e o antissemitismo; o sexismo e o preconceito a gays, lésbicas e transexuais; a austeridade e o desemprego; os armamentos nucleares; a reforma da escola pública; o fim do programa de rádio Là-bas si j’y suis, criado em 1989. Mesmo os policiais protestam nas ruas exigindo um adicional por “risco terrorista” e contra a violência sofrida nas diversas manifestações.

Anne Hidalgo e a ameaça terrorista: “Não se deve ter medo de vir a Paris”

Capture d’écran 2016-06-26 à 13.46.35

FERNANDO EICHENBERG/ O GLOBO

PARIS – Fincado no coração da capital francesa, o chamado Hôtel de Ville acolhe desde 1357 a administração municipal de Paris, mas o prédio atual foi edificado no fim do século 19, após um incêndio ter reduzido a cinzas as antigas instalações. O vasto e belo gabinete da prefeitura de Paris é hoje ocupado pela primeira vez por uma mulher. Espanhola de nascimento e francesa por adoção, Anne Hidalgo, de 57 anos, se elegeu para o cargo em 2014 disposta a sacudir com seu forte temperamento velhos hábitos da Cidade Luz — sem receio de criar polêmicas, como tem demonstrado. Além de tratar de problemas como a redução da poluição dos carros, a prefeita abraçou a candidatura de Paris como sede dos Jogos Olímpicos de 2024. À frente de uma delegação própria, viajará ao Rio no período das competições, quando também deverá ser eleita sucessora do prefeito Eduardo Paes na presidência do C40, grupo de mais de 80 cidades do mundo no combate às mudanças climáticas.

Leia a entrevista em O Globo

Polêmica racista

Capture d’écran 2016-06-12 à 23.48.34

A Eurocopa 2016 começa sob o temor da ameaça terrorista na França, mas também tentando apaziguar a polêmica surgida no país em torno de denúncias de racismo na seleção nacional.

A controvérsia foi deflagrada pelo ex-jogador Eric Cantona, ao acusar o treinador da equipe francesa, Didier Deschamps, de discriminação racial por não ter convocado Karim Benzema e Ben Arfa por causa das origens magrebinas dos dois jogadores.

– Ele, Deschamps, tem um nome muito francês. Aliás, talvez seja o único em nosso país a ter um verdadeiro nome francês. Ninguém, na sua família, se misturou com qualquer outro. Como os mórmons nos Estados Unidos. Os dois (Benzema e Ben Arfa) têm origens norte-africanas. Portanto, o debate está aberto – anunciou Cantona.

Para filósofo francês, ataque em Paris expôs limites da laicidade republicana

MICHEL MAFFESOLI, SOCIOLOGUE, PARIS, LE 10 AVRIL 2014.

FERNANDO EICHENBERG / FOLHA DE S. PAULO

PARIS – O pensador Michel Maffesoli, reconhecido estudioso da pós-modernidade, credita grande parte dos conflitos atuais na sociedade francesa a uma inabilidade em acolher o retorno do sagrado e do religioso, que na falta de espaços de expressão gera desvios perversos e favorece a sedução de jovens pelo islamismo radical.


Na sua opinião, a laicidade francesa não soube integrar o religioso de forma harmônica e em “doses homeopáticas”, segundo sua própria metáfora.


Para ele, que lançou neste mês, em coautoria com Hélène Strohl, o ensaio “La France Étroite – face au intégrisme laïc, l’idéal communitaire” (“a França estreita – diante do integrismo laico, o ideal comunitário”, em tradução livre), a França vive hoje um delicado momento de mutação, rumo a uma sociedade concebida como um mosaico de culturas, em detrimento da República “una e indivisível” dos tempos modernos.