Paris: de Cidade Luz a cidade fantasma

Normalmente movimentado, o bairro de Saint-Germain-des-Près revela suas ruas vazias em pleno período de confinamento. ©Fernando Eichenberg

FERNANDO EICHENBERG / O GLOBO

PARIS – A Cidade Luz, célebre epíteto de Paris, se tornou uma cidade fantasma desde a terça-feira. A capital francesa, campeã mundial em número de turistas, silenciou suas ruas, praças e os sempre concorridos terraços de seus cafés. A Torre Eiffel, conhecida por suas longas filas de espera, se transformou em um monumento inabitado. A Mona Lisa, habituada à incessante agitação diária, agora é uma senhora abandonada à solidão do Louvre, o museu mais visitado do planeta de portas cerradas.

Os parisienses aos poucos se adaptam ao novo cenário citadino e à inusitada rotina do confinamento provocado pela repentina invasão do coronavírus, o inimigo invisível em uma cidade de desertas paisagens. Os policiais, até há pouco ocupados em enfrentar numerosos manifestantes em protesto contra reformas do governo, agora patrulham a cidade em busca de moradores que desrespeitam as estritas regras da quarentena e saem à rua sem uma justificativa válida ou desprovidos da atestação oficial obrigatória. Em apenas um dia, foram aplicadas em Paris 1.161 multas, no valor de € 135, aos infratores inconscientes da gravidade da crise. Para os reincidentes, a pena sobe para € 1.500. E aumenta ainda para € 3.500 e seis meses de prisão para quem cometer o delito pela terceira vez.

Ir ao supermercado para as compras alimentares, uma das poucas saídas autorizadas, é como brincar de esconde-esconde. Os clientes se esgueiram, se evitam, trocam de corredor quando há mais pessoas, e fogem quando escutam um pigarro ou um espirro.

Nesta nova vida, a solidariedade é audível. Diariamente, às 20h, ecoam pelos diferentes bairros os aplausos da população em um sonoro gesto de apoio aos médicos, enfermeiros e todos profissionais de setores essenciais que trabalham em meio à crise sanitária. Pelo Facebook, grupos organizam eventos como “Happy hour na janela” e “Festa nas sacadas”, com direito a DJs e o lema “Gritem, mas, sobretudo, permaneçam em casa!”.

Encerrados em seus lares, os parisienses se surpreendem com o canto dos pássaros, antes acobertados pelos ruídos da cidade, e descobrem um prazer inédito: admirar o asseado céu azul deste início de primavera, pela primeira vez despido dos onipresentes riscos pintados pelas turbinas dos aviões, dormentes em seus hangares.