FERNANDO EICHENBERG/ ZERO HORA
PARIS – As vaias do público brasileiro ao atleta francês Renaud Lavillenie na prova de salto com vara chegaram audíveis aqui na França, provocando ampla repercussão na mídia nacional. Mas além da reação da torcida no Rio, a reação do próprio francês, derrotado na reta final pelo brasileiro e novo recordista olímpico Thiago Braz, ecoou do outro lado do Atlântico. Lavillenie, medalha de ouro na modalidade em 2012, nos Jogos Olímpicos de Londres, esperava repetir o feito no Rio, e não poupou palavras para descarregar sua frustração com a atitude da audiência nas tribunas olímpicas do Engenhão.De cabeça quente, comparou a vaia brasileira com as Olimpíadas de 1936, em Berlim, quando o atleta negro americano Jesse Owens conquistou quatro medalhas de ouro no atletismo sob o olhar contrariado de Adolf Hitler. “A última vez em que se viu isso (as vaias), foi quando Jesse Owens correu em 1936”, disparou em uma entrevista. Depois, diante das inúmeras críticas, e provavelmente advertido pelo despropósito de sua declaração, se retratou no Twitter: “Sim, desculpem pela má comparação que fiz. Foi uma reação no calor da hora e me dei conta que estava errado. Peço desculpas a todos”, escreveu. A imprensa francesa, inclusive, chegou a lembrar ao seu atleta que nos Jogos de Berlim grande parte dos alemães presentes aplaudiu as vitórias de Jesse Owens.
Mas Lavillenie não mostrou arrependimento por outros de seus desabafos. O atleta definiu o clima e a audiência no Estádio Olímpico como “um público de merda”. “Eu não admito vaiar atletas. Melhor que fiquem em casa na frente da tevê, e que deixem seu lugar para outras pessoas com vontade de ver esporte. Há uma verdadeira frustração e decepção de ver que não há nenhum valor de respeito e de fair-play. É realmente uma pena. Se isso não tivesse ocorrido, a competição teria sido incrível, pois haveria lembranças inesquecíveis. Se sente a maldade do público contra si”.
E acrescentou: “Pratico um esporte em que não se vê nunca isso. Não é futebol, não é a vida real. Entendo perfeitamente que os brasileiros torçam por Thiago Braz, mas a falta de respeito não é normal. Eu encarei isso como um insulto. Não penso que seria igual na França. Não foi assim também em Londres, onde em todos os locais em que um atleta estava competindo, o público nunca vaiou seu adversário. É incrível”.
O ex-jogador da seleção francesa de futebol Jerôme Rothen reagiu via Twitter: “Ah, as generalizações!!! Bravo monsieur Lavillenie. Você foi vaiado! Bah, nós, jogadores de futebol, nos servimos disso para brilhar”. O BFMTV, canal de notícias de maior audiência do país, lançou o debate pela interrogação: “JO: um público indisciplinado?”. Comentaristas esportivos franceses relativizaram as vaias nestas primeiras Olimpíadas realizadas no continente sul-americano, classificando-as como normais nas disputas de futebol, handball ou vôlei, mas apontando-as como uma novidade nas provas de atletismo, contrariando os códigos e os valores do olimpismo. Mais pragmático, um deles, Serge Simon, disse que a equipe de Renaud Lavillenie deveria ter se antecipado e preparado seu atleta para esta situação: uma competição com vaias.