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Uma conversa em Paris com Michel Houellebecq

© Philippe Matsas/Leemage via Zuma Press

FERNANDO EICHENBERG

PARIS – O escritor francês Michel Houellebecq será a atração desta noite (07/11) do ciclo “Fronteiras do Pensamento”, às 19h45 no Salão de Atos da UFRGS, em Porto Alegre. Sob proteção policial desde os atentados de janeiro de 2015 na França, ele estava vigiado por dois agentes quando nos encontramos quatro meses depois, para uma entrevista em uma sala do primeiro andar do prédio da editora Flammarion, na praça Odéon, em Paris, na primeira semana de  maio.

Um dos autores franceses contemporâneos mais celebrados e traduzidos no mundo, vencedor do prestigiado prêmio francês Goncourt (2010), e autor de obras como “Partículas elementares” ou “A possibilidade uma ilha”, ele tivera seu mais recente romance, “Submissão”, lançado no país no mesmo dia do ataque terrorista na redação do jornal satírico “Charlie Hebdo”, que causou a morte de 12 pessoas, inclusive a de seu amigo Bernard Maris, economista e colaborador do semanário visado. Por recomendação das autoridades francesas, o escritor passou uma semana na casa de seu amigo e músico Jean-Louis Aubert. “Neste tipo de acontecimento, não se pode nem mesmo dizer que se consegue pensar algo, foi algo tão atípico. Não me dava conta de que era verdade. Foi preciso que o noticiário repetisse dezenas de vezes que se tratava de algo real, para que pudesse realmente acreditar”, contou, enquanto intercalava ininterruptamente cigarro eletrônico e de tabaco.

Em “Submissão”, ele narra uma França do ano de 2022, em que Mohammed Ben Abbes, candidato de um partido islâmico moderado, vence as eleições presidenciais em uma disputa contra Marine Le Pen, atual líder da extrema-direita no país. O personagem principal, François, um professor universitário  infeliz e solitário, especialista sobre o escritor e crítico de arte Joris-Karl Huysmans (1848-1907), se converte à nova realidade francesa em que as mulheres perdem seu espaço no mercado de trabalho e passam a andar cobertas por véus, a poligamia é permitida e a laicidade, esquecida.

O livro, acusado na França de islamofóbico, provocou um rastro de polêmicas e se tornou tema de todos os editoriais e debates na mídia, entre os que o defendiam e os que o censuravam, fossem críticos literários, filósofos, políticos de todas as tendências e personalidades. Mesmo o presidente da República, François Hollande, disse que leria a obra por causa das controvérsias surgidas. No dia seguinte ao atentado, o primeiro-ministro francês Manuel Valls declarou: “A França não é Michel Houellebecq”. Em resposta, na vizinha Alemanha, o jornal “Tageszeitung” estampou o título “Eu sou Houellebecq”, argumentando que quem qualificá-lo de “autor de escândalos que só faz provocações deliberadas, deveria retirar Sade, Rimbaud, Baudelaire e Balzac de sua biblioteca”.

Houellebecq sempre primou por seu linguajar franco e direto, avesso aos tempos do politicamente correto. Polêmicas nunca lhe amedrontaram, mas confessou ter sido abalado pela violência terrorista e pelos virulentos ataques ao seu livro. “O lançamento deste livro na França foi de uma violência incrível. Foi bastante duro. Talvez as dificuldades que os franceses e europeus têm em geral com o islã sejam ainda maiores do que eu pensava. Eu nunca havia sido atacado desta maneira”, confessou, ao definir a obra como uma “ficção-política” que um dia poderá se tornar realidade. Para Michel Houellebecq, a França passa por uma grave crise política – “Os franceses vivem a sensação de uma grandeza perdida há muito tempo, há uns 40 anos; e eles sofrem” – e o Ocidente ruma na direção de algo “caótico, violento e imprevisível”.

A íntegra da entrevista está incluída no livro “Entre Aspas 2” (ed. L&PM, 2016).

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